Com os dados divulgados nesta terça-feira (31) pelo IBGE e com os aprendizados de outros países, Brasil deve se preparar para o pior após pandemia
Por Ernani Reis, da Capital Research
Diariamente, acompanhamos a cobertura sobre o coronavírus nos principais meios de comunicação e a importância de achatar a curva de contágio nas primeiras semanas da epidemia. Medidas e estímulos do governo estão sendo anunciados semanalmente para auxiliar no combate ao vírus e reduzir o efeito prolongado sobre a economia, sobretudo o desemprego. E aos poucos, as incertezas vão abrindo espaço para uma nova realidade de milhares de brasileiros.
Começando por esta semana, o Banco Central divulgou a sua primeira leitura negativa para o PIB de 2020, projetando uma retração de 0,48% para o ano, o que, apesar de ainda não ser considerada uma recessão "técnica", já é vista como indicativo de algo inevitável neste momento. De qualquer forma, mesmo sendo uma notícia negativa, a nova previsão retira da equação a expectativa de crescimento neste ano e o mercado passa a se orientar por uma nova realidade. O ponto de estresse agora passa a ser o aumento do desemprego, que não só atinge a milhões de pessoas, como torna o processo de recuperação econômica ainda mais lento.
Para piorar o quadro, na manhã da terça-feira (31), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou a taxa de desemprego entre os meses de dezembro e fevereiro, de acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua). Os números apontaram para um aumento de 0,4 ponto percentual em relação ao trimestre anterior (de novembro a janeiro), chegando a 11,6%. Esse valor representa o aumento de 479 mil desempregados com a inclusão de fevereiro e exclusão de novembro da conta, porém, ainda significa 711 mil desempregados a menos no comparativo com o mesmo período do ano passado.
Vale ressaltar, porém, que os dados ainda não contemplam o impacto do coronavírus na economia, o que deve mudar exponencialmente nos próximos 70 dias. No entanto, o número indicado pelo IBGE serve para elevar o patamar de desempregados do qual nós estamos partindo para enfrentar essa crise.
Para tentar remediar isso, o governo vem tomando medidas na direção da preservação dos postos de trabalho. Entre a suspensão do depósito do INSS e do pagamento de alguns impostos, a medida mais polêmica foi o anúncio da liberação para a redução de até 70% do salário dos empregados por parte das empresas.
No entanto, tal medida deve beneficiar mais diretamente o médio empresário, já que as grandes empresas ainda devem optar por outros recursos como a antecipação de férias adquiridas, determinação de férias coletivas e/ou uso do banco de horas neste primeiro momento, enquanto para o pequeno empresário, que é mais diretamente afetado pelo isolamento social, a medida deve ser insuficiente para impedir que ocorra um processo de demissões mais agudo. Isso sem contar o grande número de trabalhadores autônomos e informais, que não entram na conta dos desempregados, mas também devem aumentar a fila dos dependentes do governo nos próximos meses.
O sinal de alerta foi ligado para o Brasil ainda na semana passada, quando o Departamento do Trabalho dos EUA divulgou o aumento do pedido de seguro-desemprego em 3,283 milhões de pessoas, ante a projeção de 1,5 milhão, que já era considerada acima das médias anteriores do período.
Entre os setores mais atingidos, comércio, serviços, hotelaria, companhias aéreas, bares e restaurantes estão na linha de frente, pois dependem diretamente da circulação de pessoas pelas ruas que se encontram vazias devido ao isolamento social. Já o setor de combustível deverá ter os resultados prejudicados tanto por conta da queda de demanda quanto pela queda do preço de petróleo, que ronda US$20 por barril no tipo WTI.
Como antídoto a tudo isso, o modelo adotado pela China de reforçar o isolamento nos primeiros 60 dias em busca de uma retomada mais rápida após o período é a única referência positiva que temos até o momento. E os índices PMI industrial (52 em março contra 35,7 em fevereiro) e PMI de serviços (52,3 contra 29,6) divulgados na segunda-feira (30) confirmam isso.
Porém, replicar o modelo adotado pelos chineses em um país em desenvolvimento como o Brasil, que ainda precisa atravessar o pico da epidemia nas próximas semanas e não possui a mesma estrutura financeira do gigante asiático e ainda atravessa um momento de instabilidade política é um desafio e tanto. Dessa forma, se o isolamento social se prolongar além de abril, o número de desempregados no Brasil deve escalonar rapidamente e estender ainda mais a curva da tão desejada retomada econômica.