Indígenas queimam eucaliptos de área que fornece para a Suzano
02/07/2022 10:38 em Política

Poder360

Indígenas Pataxó realizaram na 4ª feira (22.jun.2022) a retomada do que eles afirmam ser uma área tradicional no município de Prado, ao extremo sul da Bahia. A ação foi realizada por cerca de 180 indígenas que ocuparam o local. Desses, 40 são crianças.

 

A área ocupada é uma fazenda chamada Santa Bárbara, que o grupo diz estar no interior dos limites do Território Indígena Pataxó Comexatibá. Em vídeo gravado no domingo (26.jun), o Cacique Mãdý Pataxó declara que a etnia não irá mais permitir a destruição de seu território.

 

Mãdý menciona as empresas de papel Veracel Celulose e Suzano, uma das principais produtoras globais de celulose de eucalipto. No vídeo, é possível visualizar uma floresta em chamas. Segundo o cacique, o objetivo do fogo é “destruir” as árvores de eucalipto que servem às empresas.

 

Em entrevista, indígenas Pataxó afirmam que o eucalipto tem trazido preocupações para os povos da região.

 

O cacique Mãdý disse que a cultura e o povo Pataxó foram “contaminados” pela plantação de eucaliptos. Na época em que plantou, morreram peixes e muitos animais. Agora, nós estamos preocupados com a nossa saúde, o rio está sendo contaminado”, diz.

 

Além dele, Samingo Pataxó –que é do mesmo povo, mas não faz parte do grupo que ocupa o território– afirma que, por conta da plantação, a água da região não está limpa e que a área atrai a atividade de fazendeiros.

 

Em nota, a Finpat (Federação Indígena das Nações Pataxó e Tupinambá do Extremo Sul da Bahia) afirma que o desmatamento e o uso de agrotóxicos nas plantações de eucalipto têm afetado os recursos hídricos e destruído fragmentos da Mata Atlântica. Eis a íntegra (149 KB).

 

De acordo com o cacique Mãdý, fazendeiros fizeram um “corredor de fazendas” em torno de uma bacia hidrográfica da região.

 

Mãdý relata que a empresa Suzano é uma das responsáveis pela plantação que se espalhou no território, por negociar com os proprietários a compra de eucalipto.

 

No entanto, a companhia afirma em nota que a área, que fornece madeira para as operações da empresa, não está localizada dentro de território indígena.

 

A Suzano diz não ter nenhuma área em território indígena e nem demandas fundiárias indígenas reprimidas ou judicializadas sobrepostas a suas áreas no Brasil.

 

Já a Veracel Celulose, também citada no vídeo, informou não ter nenhum tipo de operação na região do município de Prado.

 

Em comunicado, a Abaf (Associação Baiana das Empresas de Base Florestal) informou que o local onde os indígenas atearam fogo à plantação de eucalipto “não ocorreu em área própria de nenhuma das empresas associadas” que atuam no extremo sul do Estado, mas de um parceiro que fornece madeira à indústria de papel e celulose. Eis a íntegra (212 KB).

MPF

Os Pataxó, juntamente com os fazendeiros, a Funai (Fundação Nacional do Índio), o MPF (Ministério Público Federal) e a Defensoria Pública, tiveram uma reunião na 2ª feira (27.jun). Foi decidido que os indígenas continuariam na ocupação e que o Ministério Público atuaria no caso.

 

A reivindicação dos Pataxó é para que o caso sobre a posse do território seja levado à Justiça Federal, a fim de que não haja interferências de fazendeiros da região.

 

Segundo o MPF, os conflitos fundiários no local têm sido acompanhados. “No momento estamos na fase de apurações e na costura do diálogo entre os envolvidos. As medidas cabíveis serão adotadas com a conclusão desta etapa de intermediação”, disse o órgão em nota.

 

Em ofícios, o procurador Ramiro Rockenbach solicitou à Polícia Militar e às Secretarias de Segurança Pública e de Justiça, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social da Bahia a adoção de medidas de “acompanhamento e segurança” em favor da comunidade Pataxó. Eis as íntegras (1 MB).

DEMARCAÇÃO DE TERRAS

Além da participação da Justiça Federal no caso, a etnia pede ainda o fim do processo de homologação para demarcar e regularizar o território.

 

O que nos levou a ocupar a fazenda e a área é que esse é o nosso território. Ele já é delimitado, já é conhecido, a demarcação apenas que ainda não saiu. E a ação agropecuária já está se estendendo muito pelo nosso território”, declarou Mãdý.

 

Procurada desde 3ª feira (28.jun), a Funai não respondeu até a publicação desta reportagem. O espaço segue aberto para manifestação.

 

A demarcação de terras é uma das pautas da chamada bancada indígena, que irá disputar as eleições de 2022.

 

O STF (Supremo Tribunal Federal) retirou da pauta a continuidade do julgamento que decide sobre a validade do marco temporal. O presidente da Corte, ministro Luiz Fux, excluiu a ação do calendário. Ainda não há data para o caso ser retomado.

 

A tese do marco temporal estabelece que as populações indígenas só podem reivindicar terras que ocupavam na data da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988. O tema é de grande interesse do Planalto, que tem tomado o lado do agronegócio.

ALVO DE AMEAÇAS

Indígenas Pataxó ouvidos, relataram ameaças por parte dos fazendeiros da região. O grupo também ocupou no sábado (25.jun) uma área chamada Fazenda Brasília, localizada na Terra Indígena Barra Velha, próxima à cidade turística de Porto Seguro.

 

Segundo o Cacique Aruã Pataxó, a fazenda é voltada para a criação de bovinos. O líder afirma que, durante a ocupação, cerca de 200 pessoas armadas com fuzis e pistolas chegaram ao local em caminhonetes e os retiraram do local.

 

Em vídeo gravado por um fazendeiro, é possível ouvi-lo dizendo que “daqui para frente, invadiu propriedade, todo mundo vai cair para cima”.

 

O deputado federal Valmir Assunção (PT-BA) enviou na 4ª feira (29.jun) um ofício ao presidente da CDHM (Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados), o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), solicitando a atuação da comissão no caso. Eis a íntegra (362 KB).

 

No documento, Assunção chama o grupo de fazendeiros de “milícia armada” e diz que, segundo denúncias do MIBA (Movimento Indígena da Bahia) e do Centro Indigenista Missionário, os agropecuaristas levaram os telefones dos líderes indígenas do local.

 

“Não é a primeira vez que identificamos a atuação de milícias armadas na região Extremo Sul da Bahia. Estes têm se arvorado no atual momento político e contam com a impunidade oferecida pelo governo de Jair Bolsonaro frente estes casos”, afirma o deputado.

 

Segundo a Polícia Militar da Bahia, a ação de retirada dos indígenas no sábado (25.jun) não teve o envolvimento da PM. No entanto, a Secretaria de Segurança Pública do Estado solicitou o reforço no policiamento na região desde domingo (26.jun).

 

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